Catarina Frias Gomes, Serviço de Gastrenterologia, Hospital Beatriz Ângelo
Não realizar a colheita de uma história clínica adequada
A diarreia crónica caracteriza-se por uma alteração persistente do padrão intestinal habitual do doente para fezes moles a líquidas (escala de Bristol 5-7), com pelo menos 4 semanas de evolução. Frequentemente, os doentes focam a diarreia na consistência das fezes. É igualmente importante perceber o padrão da diarreia (intermitente ou continuo), fatores epidemiológicos (viagens, contacto com pessoas doentes), a presença de dor abdominal, perda de peso, fatores iatrogénicos (medicação, radioterapia ou cirurgia) ou mesmo fatores factícios. Por fim, relembrar doenças sistémicas que podem cursar com diarreia, nomeadamente hipertiroidismo, diabetes mellitus, doenças do colagénio ou outras doenças inflamatórias, imunodeficiências primárias (imunodeficiência comum variável) ou adquiridas (HIV).
Não reconhecer incontinência fecal
Perante um quadro de diarreia crónica, deve-se considerar a presença ou ausência de incontinência fecal. As dejeções líquidas agravam os sintomas de incontinência, mas em alguns doentes o principal problema é a disfunção anorretal. Neste subgrupo de doentes, há benefício de realização de manometria anorretal.
Deixar escapar um diagnóstico pela idade do doente
Em doentes jovens, é mais frequente identificar diarreia no contexto de síndrome do intestino irritável ou doença inflamatória intestinal (DII). Contudo, pode ser também manifestação de cancro colorretal (CCR). A incidência de CCR está a aumentar em adultos jovens (20-49 anos) na Europa, com aumento de até 9% de cancro do cólon e de 3.5% de cancro do reto. Por outro lado, a incidência de DII em doentes idosos também está a crescer. Assim, a avaliação e o julgamento clínicos são fundamentais para considerar as corretas hipóteses de diagnóstico.
Não realizar biópsias durante a colonoscopia
Os doentes com diarreia crónica são frequentemente propostos para realização de colonoscopia. Nos doentes com lesões malignas, não ressecáveis por endoscópica, devem ser realizadas seis biópsias. Nos doentes com suspeita de DII, devem ser realizadas biópsias por segmentos (pelo menos duas) e colocadas em diferentes frascos (ileon, cego, ascendente, transverso descendente/ sigmoide e recto). Mesmo na ausência de alterações macroscópicas, recomenda-se a realização de duas biópsias do cólon direito (ascendente e transverso) e cólon esquerdo (descendente e sigmoide), colocadas em frascos separados.
Não aconselhar um tratamento a longo prazo
O diagnóstico de colite microscópica, diarreia associada aos ácidos biliares, intolerância a lactose, SII com predomínio de diarreia permite a orientação terapêutica correta. Contudo, é igualmente importante explicar ao doente que em determinados casos a terapêutica a longo prazo é recomendada. O uso regular de loperamida permite controlar a urgência, contudo podem ser necessários outros fármacos como antidepressivos tricíclicos, assim como antibioterapia em doentes com sobrecrescimento bacteriano. Doentes com colite microscópica podem recidivar os sintomas e beneficiar de terapêutica a longo prazo, assim como os doentes com diarreia associada aos ácidos biliares.
Referências bibliográficas: