Pesquisa

Erros comuns

Erros Comuns na Distensão Abdominal

Ana Célia Caetano

Assistente graduada de Gastrenterologia no Hospital de Braga

Dar pouca importância às queixas de distensão abdominal

A prevalência de distensão abdominal a nível mundial é 3,5% com ligeiro predomínio no sexo feminino e é transversal a todas as faixas etárias da idade adulta. Se olharmos para dados epidemiológicos da distensão abdominal associada a outras doenças do eixo cérebro-intestino, a sua prevalência aumenta para 16 a 30%. Olhando para estes números, compreendemos que afecta um grande número de doentes, influenciando negativamente a sua qualidade de vida, produtividade e o recurso a cuidados de saúde.

Não distinguir distensão abdominal de bloating

Estes termos são frequentemente descritos na literatura de modo equivalente, quer nos estudos de investigação diagnóstica quer nos estudos terapêuticos. No entanto não são iguais. O bloating é uma sensação subjectiva na região abdominal descrita com “peso” ou “inchaço” enquanto a distensão abdominal corresponde a um aumento objectivo do perímetro abdominal por ar, descrevendo o doente como se tivesse “um balão”. Existem pictogramas de distensão abdominal e bloating com acuidade diagnóstica superior aos descritores verbais que podem ser usados facilmente na prática clínica.

Assumir que a distensão abdominal é toda igual

A etiologia da distensão abdominal e do bloating é complexa e multifactorial. Os mecanismos fisiopatológicos incluem 1) excesso de produção, 2) reduzida eliminação e 3) percepção desconfigurada. 1) Situações de mal absorção de hidratos de carbono e desequilíbrios da flora intestinal (disbiose) causam excesso de produção. 2) Situações de obstipação e distúrbios evacuatórios condicionam menor eliminação a nível anal e a mesmo disbiose condiciona menor consumo e menor difusão dos gases do lúmen intestinal. 3) Na percepção desconfigurada estão incluídos mecanismos de microinflamação e hipersensibilidade visceral assim como a dissinergia abdomino-frénica. Esta percepção desconfigurada pode ser altamente influenciada por aspectos comportamentais e da personalidade do doente como ansiedade, somatização e hipervigilância.  

A investigação diagnóstica deve ser completa

A avaliação de mal absorção de hidratos de carbono pode ser realizada por restrição dietética de curta duração (2 semanas), començando pelos substratos mais prevalentes associados a mal absorção – frutose e lactose. Em doentes sintomáticos sem resposta a dieta restritiva de curta duração pode ser realizado teste respiratório usando a frutose e a lactose como substratos habitualmente. O estudo dos casos de obstipação pode incluir avaliação evacuatória com manometria anorectal e imagem dinâmica ou trial de laxante. O sobrecrescimento bacteriano do intestino delgado (SIBO) só deve ser avaliação na presença factores de risco bem definidos e manifestações de mal-absorção. Nos casos de bloating e distensão abdominal, o SIBO é um mecanismo fisiopatológico pouco provável e os testes respiratórios específicos têm acuidade baixa. A hipersensibilidade visceral e a dissinergia abdomino-frénica são avaliadas também por resposta terapêutica dirigida.  

Tratar todos os doentes com distensão abdominal com probióticos

A educação e a tranquilização dos doentes devem ser os pilares terapêuticos. A dieta pobre em FODMAPs personalizada e acompanhada por nutricionista pode ajudar alguns doentes com distensão abdominal e bloating. A neuromodulação com amitriptilina (sem obstipação) ou duloxetina (com obstipação) e/ou as terapias comportamentais eixo cérebro-intestino têm mostrado benefício em vários estudos. O biofeedback anorectal nos casos de distúrbios evacuatórios e o biofeedback ou técnicas de respiração diafragmática podem beneficiar os doentes com predomínio de distensão abdominal.